Thursday 26 May 2011

A trança toda vermelha!



Bastava ela semi-cerrar os olhos quando o balanço voltava de seu vai e vêm, e a sua longa trança cobrisse por alguns segundos a sua visão, para que ela visse o mundo em vermelho.

Ela era ruivinha, ruivinha.

Era como se alguém pegasse um pincel melado do vermelho mais rubro e fizesse um risco no azul do céu.

O balanço era uma máquina de fazer vento. E de fazer frio na barriga também!

MAIS ALTO, MAIS ALTO! Esse era o seu mantra silencioso!

Por alguns segundos mais pertinho do céu.

E de novo a terra,
e logo céu novamente,
e terra.

O legal da Terra era o impulso que ela dava para o céu.

Azul.

Terra, céu, raio de fogo com frio na barriga, Terra e céu novamente e assim por diante.

Ah, e risos! Ela sentia o seu corpo sorrir. Seus braços sorriam, suas pernas e coração também.

E Poder! O movimento das pernas, o gingado do corpo fazia com que a intensidade do vôo fosse controlada.

De vez em quando ela não sentia nada e aí então sorria.

Era muito bom!

E se...

O Azul se mostrava cada vêz mais atraente. A terra começava a se fazer inoportuna.

E se...

No próximo azul, pensou ela com seu estômago repleto de borboletas, no próximo azul eu vou.

No próximo azul, eu vôo!

E assim foi.

Céu, raio de fogo com frio na barriga, terra, céu azul e... as mãos soltaram a máquina.

 Tal qual Ícaro ela vôou.

Sem consciência, em riso,  por alguns segundos chegou um pouquinho mais perto do céu.

Fugaz.

Logo a Terra a clamou. Assim como a mãe que percebe um filho que se distancia além de um limite seguro.

A terra a chamou.

Terra.

Água.

As suas lágrimas molharam a Terra.

Sangue.

Não se sabe de onde pois ele vinha de tantas partes.

Dor.

As borboletas fugiram assustadas de seu estômago no exato momento em que ela abriu a sua boca e gritou por sua mãe.

Só céu é morte. Só terra também. O encanto e a alquimia estão na mistura balanceada dos elementos. A sopa primordial, a receita da vida.

Ela cresceu, virou física e hoje leva a sua filha para o mesmo parque onde a química da vida se revelou para ela.

Pintou os cabelos de castanho e, silenciosamente agradece pelo fato de sua filha não ser ruiva.

4 comments:

Valéria Scavuzzi said...

Olá Marcello,
Não sabia que você era escritor, também eu, por aqui, estou tentando enveredar pelo caminho das palavras. Faço oficina de literatura com Raimundo Carrero, já ouviu falar dele ? Estudamos um livro dele para vestibular: "A história de Bernarda Soledade. A tigre do sertão.".
Gostei muito de seu conto.
beijos, Valéria.

Ana Luiza Bosschart said...

Ayo, muito bom. Beijos e saudades.

Stela said...

Querido, quanta inspiracão! Amei!Lembrei-me de quando era crianca e balancava alto, cada vez mais alto... Que delícia!

Leticia Maranhão said...

Que texto lindo, amei !!! Principalmente" O encanto e a alquimia estão na mistura balanceada dos elementos. A sopa primordial, a receita da vida". Profundo!!! Adorei!!! Bjsss!!!